Sunday, October 12, 2008

Sunday, September 21, 2008

"Homenagem a Arthur Rimbaud" de Carlos Queiroz, António Pedro e Jorge de Sena


Esta separata da revista Aventura foi publicada em 27 de Agosto 1942, destinada a comemorar o quinquagenário da morte de Arthur Rimbaud. Exemplar raro, com edição de 100 exemplares, e facilmente degradável, inclui ainda nas páginas 9-10 um desenho de António Pedro representando o poeta francês.
É setembrina a dedicatória de Carlos Queiroz ao lusófilo e amigo Pierre Hourcade. E sobre a inscrição passaram há pouco 66 anos exactos...

Saturday, September 20, 2008

"A Tragédia de IVLIVS CAESAR" de William Shakespeare traduzida, anotada e comentada por Luís Cardim (1925)


Vinda a lume sob a prestigiada chancela da "Renascença Portuguesa", esta tradução de Luís Cardim é claro exemplo da honestidade intelectual do colaborador da presença - problematizantes e esclarecedoras, avançando o possível, as palavras do tradutor (e não só) espicaçam desde o início : "A obra de Shakespeare, qual a possuímos, pode ser comparada, sob certos aspectos, a uma catedral medieva."
Este é um brilhante e actualizado esforço para a compreensão dos enigmas que só os grandes autores colocam. E a tradução um elevado sopro ático sobre um texto complexo e necessário...

Tuesday, September 16, 2008

"Varanda" (1934) de Alberto de Serpa




Dedicada a Botto, Régio e Carlos Carneiro, esta Varanda de Alberto de Serpa é espaço contemplativo para a melhor poesia...

Wednesday, August 13, 2008

Carlos Queiroz na "presença"




António Manuel Ferreira


Universidade de Aveiro


1.


Em 1931, Carlos Queiroz publica, no nº 31 da revista Presença, quatro poemas pertencentes, segundo uma nota adicional, ao livro inédito Curva no Espaço. Tal livro nunca foi publicado; mas, em 1933, no nº 39 da mesma revista, surgem mais cinco poemas, acompanhados da seguinte informação: «do livro a publicar Desaparecido». O livro, o primeiro do autor, só surgirá em 1935, mas é interessante a circunstância de ter sido anunciado nas páginas da revista coimbrã, porque é um indício simbólico da estreita ligação que o poeta de Lisboa manteve com a revista de Coimbra. Com efeito, Carlos Queiroz publicou na Presença um considerável conjunto de textos, não apenas poemas, mas igualmente um ensaio sobre Camilo Pessanha, os «Fragmentos de algumas cartas de amor de Fernando Pessoa», e ainda a «Carta à Memória de Fernando Pessoa». Estes dois últimos trabalhos surgem nº 48, de Julho de 1936, um volume dedicado ao poeta dos heterónimos, de cuja morte havia sido dada notícia no nº 47, de Dezembro de 1935.


Depois dos textos sobre Fernando Pessoa, Carlos Queiroz só voltará a colaborar na Presença mais uma vez, no nº 49, de Junho de 1937, com o longo poema «A Falência das fórmulas». Este facto é relevante porque, como é sabido, os dois poetas iniciam a sua colaboração na Presença precisamente na mesma altura. Na verdade, no nº 5, de Junho de 1927, aparece na revista o texto «Quatro Poemas do retardador», de Carlos Queiroz, o poema «Marinha», de Fernando Pessoa, e ainda um texto intitulado «Ambiente», assinado por Álvaro de Campos. Acrescente-se ainda que, no mesmo número surge também um poema inédito de Mário de Sá-Carneiro («Ápice»), e, para completar o conjunto, o desenho da capa da revista é assinado por Almada Negreiros e é dedicado a Carlos Queiroz.


O poeta de Desaparecido não pertenceu ao Orfeu (em 1915 tinha apenas 8 anos), nem, em rigor, pertenceu à Presença, isto é, ao seu núcleo fundador. No entanto, é Carlos Queiroz quem estabelece a ligação entre as duas revistas, exercendo, como diz David Mourão-Ferreira, o «papel de medianeiro privilegiado entre o grupo do Orfeu e o grupo da Presença, entre os modernistas de Lisboa e os modernistas de Coimbra, entre a primeira e a segunda geração do Modernismo português»1. E, segundo testemunho de João Gaspar Simões, «foi a sua lúcida juventude que lhe permitiu ver mais cedo do que qualquer outro escritor jovem de Lisboa nos escritores jovens da Presença aquilo que os identificava: a coerente modernidade, a desempoeirada visão dos problemas da arte. Com ele viriam os outros e, em parte graças a ele, inclusivamente, Fernando Pessoa e Olavo d’Eça Leal»2.


Sintomaticamente, a morte de Pessoa quase determina o fim das relações de Queiroz com a «folha de arte e crítica». Ainda segundo David Mourão-Ferreira, um dos motivos que contribuíram para o afastamento de Carlos Queiroz prende-se com o facto de o poeta, a partir de 1937, ter iniciado uma importante colaboração com a Revista de Portugal. A quantidade de textos publicados na revista dirigida por Vitorino Nemésio, bem como o «”conflito” que entre as duas publicações se gerou»3 terão sido os principais responsáveis pelo afastamento de Carlos Queiroz e pela consequente impossibilidade de acompanhar a Presença até ao seu derradeiro número, publicado em Fevereiro de 1940. De qualquer modo, num plano mais simbólico, é tentador pensar na morte de Pessoa como um marco no trajecto presencista do poeta, pois ele era, nas palavras do seu amigo José Gomes Ferreira, «admirador idólatra de Fernando Pessoa»4, sendo também «presencista cem por cento, embora com a liberdade de sonho suficiente para não se recusar a exprimir os “ciúmes do futuro” da pequena burguesia agonizante através deste berro que soou pela primeira vez na poesia portuguesa: “invejo-te, operário”»5.


É conhecida a tese de David Mourão-Ferreira, segundo a qual a colaboração de Carlos Queiroz na Presença «será das raras que virão conferir um carácter menos “provincial” e mais equilibradamente desenvolto à produção poética de quase todo o grupo»6. Menos “provincial” será, se relacionarmos o termo com a proveniência geográfica de grande parte dos fundadores da Presença, rapazes de origens “provinciais”, enquanto Queiroz, «lisboeta, tipicamente lisboeta, por pouco “alfacinha”»- conforme o retrato traçado por Gaspar Simões7- representaria o imaginável cosmopolitismo da Lisboa da década de 30. No entanto, no que concerne ao tipo de poesia publicada nas páginas da revista – embora se notem certas particularidades estilísticas conformadoras de um estilo pessoal em evidente construção - não parece haver uma abissal diferença entre a poética de Carlos Queiroz e a dos presencistas mais “provinciais”, nem, sobretudo, uma assinalável divergência em relação aos princípios basilares que configuravam o rumo teórico da Presença. Curiosamente, em Junho de 1944, no nº 1 da revista Litoral, dirigida precisamente por Carlos Queiroz, o primeiro texto, não assinado, constitui uma espécie de carta de princípios, não um «programa», mas uma «Posição», salientando-se algumas linhas de rumo que, de certo modo, se assemelham aos manifestos presencistas de José Régio. Assim, pode ler-se que a revista, «sem abstrair qualquer ordem de questões e interesses profundamente humanos e vitais (...), aplicar-se-á, de preferência, ao estudo e valorização desinteressada dos motivos eternos, dos valores essenciais, dos problemas permanentes»8; e mais adiante pode ainda ler-se que as páginas da revista darão «acolhimento e expansão a produções ficcionistas de Autores portugueses e brasileiros, sem atender a preconceitos de geração ou de escola, mas desde que revelem vocação autêntica, voz própria, e determinado grau de madurez substancial e formal»9. Como se vê, nenhuma destas orientações se distancia dos enunciados presencistas formulados por Régio em 1927.



2.


No que diz mais directamente respeito à poesia de Queiroz publicada na Presença, é de notar que os poemas mais representativos elaboram os temas maiores do autor: a relação ambígua com o mundo da infância, o peso doloroso de uma memória refractária a qualquer tentativa de concertação voluntariosa, a consciência dorida da condição de poeta como marca eufórica e disfórica, que repele o vulgo profano, mas também diminui as possibilidades de o poeta fazer corpo com a vida, a tendência para um certo ludismo estilístico resultante, por um lado, do jogo de palavras subordinadas ao esquema da figura etimológica e, por outro lado, veiculado pelo processo de associação imagística de teor um pouco surrealizante; a propensão para um tipo de poesia marcada pela concisão epigramática; e finalmente, em conexão com o dúbio fatum de poeta, a amarga dúvida acerca do hipotético poder libertador da palavra poética.


Assim veja-se, por exemplo, o primeiro texto publicado na revista, um conjunto de poemas coordenados pelo título “Quatro Poemas do Retardador”. Chama desde logo a atenção a maneira como os responsáveis pela orientação gráfica da revista – lembre-se que tanto o logótipo da Presença como a generalidade do seu grafismo são em grande medida da responsabilidade de Branquinho da Fonseca – exploram bem as possibilidades óptico-grafemáticas, ao terminarem o desenho do título salientando de forma destacada a sílaba “Dor”, que pode funcionar como uma palavra. O jogo patente no título continua depois no primeiro excerto, nomeadamente na primeira e na terceira estrofes, através de versos como «Um lírio, liricamente», «O luar que o lago alaga», «Lento, lenta, lentamente», exemplos que podem ilustrar um certo investimento na rendibilização das faculdades encantatórias das palavras, uma busca de ritmo e, sobretudo, um visível labor oficinal, cujos resultados, ao nível do rendimento da linguagem poética, não são alheios a outros autores presencistas, embora não constituam uma preocupação central de poetas como, por exemplo, José Régio, cuja poesia, ampla e espraiada, não teme a ocasional rudeza dos versos, nem a dinâmica expansiva das ideias e dos sentimentos mais obsidiantes.


De todos os temas glosados por Carlos Queiroz nos poemas publicados na Presença adquirem especial relevo a visão da infância e a reflexão sobre a poesia; não tanto no sentido metapoético, que surgirá nomeadamente em Breve Tratado de Não- Versificação, mas num plano existencial, isto é, mais ligado à figura do poeta. Quanto ao tema da infância, há, por um lado, o sentimento de nostalgia por um tempo fundador e irrecuperável, e, por outro lado, o carácter fundador desse mesmo tempo tem um travo de ameaça, cujas consequências deletérias se cumprem no presente, como se pode ver no poema “Soneto”: «De neblina um luar frio reveste/O meu passado: a infância foi-me inglória;/E dela não ficou mais do que a história/Dum menino, uma fada e um cipreste»; e, de forma mais impressiva, estas duas passagens do “poema anti-saudosista Reminiscente”: «Ah! o passado, o passado!/Que ventoinha, que remoinho/Que sorvedouro inexorável!/ (...) Ah! o passado, o passado!/não conhecem aí nenhum dentista/Que me arranque este dente cariado?». Em estreita ligação com o peso do passado desenvolve-se a reflexão sobre a memória como força incoercível, mais fatídica do que energética: «A memória devia/ser uma espécie de cabelo/que a gente cortasse quando quisesse...». Note-se que o lastro negativo da memória é na poesia de Carlos Queiroz tanto pessoal como colectivo, propiciando, por isso, uma visão desencantada de uma pátria que, é apresentada «a um estrangeiro» da seguinte maneira: «Isto de ser poeta e português/Não é tão simples como imaginais./Vede em Camões, Antero e Pascoaes/O que essa estrela dúplice lhes fez//(...) Gomes Leal, Cesário Verde...tantos!/Se fossem doutro povo, doutra raça,/Seriam geniais, - mas sem desgraça./Os poetas, aqui, são como os Santos:/Não conhecem os frutos dos seus prantos/E a glória é póstuma ilusão que passa»10. Num dos poemas insertos em Breve Tratado de Não-Versificação, Carlos Queiroz, no estilo burilado do seu veio epigramático, sintetizará desta forma o seu desalento: «Português e vivo/É diminutivo.//Só fazemos bem/Torres de Belém»11.


Mas, voltando aos poemas publicados na Presença, verificamos que a reflexão sobre o destino do poeta não denota ainda esta ironia amarga, havendo apenas um «Epigrama» sobre Camões, cujo alvo é a «douta Academia», uma instituição que, como lembra João Gaspar Simões, se transformou no «bode-expiatório dos dois modernismos – o do Orpheu e o da Presença»12. Nos restantes poemas ganha forma um dos motivos maiores da obra de Queiroz, designado por Fernando Vieira-Pimentel por «confronto entre a vida e a arte»13. Efectivamente, o dissídio existente entre o destino de poeta e o apelo epicurista ao gozo dos frutos terrestres constitui uma linha temática apreensível no conjunto da obra organizada por David Mourão-Ferreira, e delineia-se também em alguns textos “presencistas”. Assim, no poema intitulado “Epigramas a um Poeta que talvez seja Eu”, o registo entre o jocoso e o patético não consegue obliterar a clareza expressiva de afirmações que configuram uma imagem distorcida do poeta: «-Sou poeta! Não tenho vocação/Para a vida onde lidam os vulgares»; «-O menino cresceu; é hoje um homem;/E embora por alguém o tomem,/Quando o vêem passar, dizem: Coitado!/é um poeta, (um aleijado!». Poder-se-ia pensar que versos como este são mera retórica de romantismo enviesado e dessorado, ou então, simples exercício de caricatura. Não creio, no entanto, que seja assim, porquanto, de variadas formas, esta imagem funciona como um tema estruturante do universo poético de Carlos Queiroz. No último poema publicado na Presença, o já referido “A Falência das fórmulas” diz-se que «as palavras não resolvem nada», e nada resolve a inquietação interior, nem «as máximas de Nietzsche», nem «o próprio Goethe», nem os ditos de Sócrates ou as análises de Freud; e quanto à Bíblia, «consola tanto como a água do mar/a quem morre de sede no mar». Por isso, o poeta inveja «aquelas pessoas horrivelmente felizes/a quem tudo acontece/num plano em que não cabe a mais vaga noção/de análise introspectiva». Estamos, pois, perante a pessoana “dor de pensar”; o pensamento entendido como morboso impedimento, que contamina a saudável relação do homem com a vida e o mundo. Em Pessoa, essa ferida inicial é aparentemente cicatrizada pela construção de um universo de palavras; em Carlos Queiroz ficará a certeza de que a palavra não serve de substituto, e que a reconstrução do mundo não tem o sabor da entrega sem intermediários. Por esse motivo, o poeta tanto é capaz de dizer que sente ânsias de dar à poesia «toda a vida, toda a alma», como é capaz de confessar que trocaria todos os livros «- e são muitos, podem crer-» por esse livro desejado onde não se aprende uma ou todas as ciências, «Mas a arte dificílima/De ser sempre natural». Este desejo de viver de acordo com uma espécie de aurea mediocritas utopicamente libertadora já estava inscrito em alguns poemas publicados na Presença, como, por exemplo, o “soneto de algum dia”, cujos versos finais são tão pessoanos como presencistas:



«Ser simples! Ler a Bíblia; acreditar


que existe o inferno, o purgatório, o céu


-e que tudo está bem no seu lugar


Ser como os outros, a quem Deus não deu


a Poesia por anjo tutelar


e são felizes, muito mais do que eu!»






1 David Mourão-Ferreira, «Prefácio», in Carlos Queiroz, Desaparecido/Breve Tratado de Não-Versificação, Lisboa, Ática, 1984, p. 15.


2 João Gaspar Simões, Retratos de Poetas que Conheci, Porto, Brasília Editora, 1974, p. 210.


3 David Mourão-Ferreira, op. cit., p. 12.


4 José Gomes Ferreira, A Memória das Palavras ou o gosto de falar de mim, Lisboa, Portugália, 1972, p.173.


5 Id., Ibid., p. 183.


6 David Mourão-Ferreira, op. cit., p. 11.


7 João Gaspar Simões, op. cit., p. 211.


8 Litoral, nº 1, Junho de 1944, p. 7.


9 Ibid., p. 8.


10 Carlos Queiroz, Epístola Aos Vindouros e Outros Poemas, Edição organizada por David Mourão-Ferreira,


Lisboa, Ática, 1989, p. 28.


11 Id., Ibid., p. 131.


12 João Gaspar Simões, op. cit., p.223.


13 F. J. Vieira Pimentel, A Poesia da “Presença” (1927-1940) – Tradição e Modernidade, Dissertação de


doutoramento policopiada, Ponta Delgada, Universidade dos Açores, 1987, p. 480.






Sunday, August 10, 2008

(João Carlos) Celestino Gomes ao tempo de "Soror Leonor"

Apud Ilustração Portuguesa, nº 770, 22 de Novembro de 1920, p. 332.